Aceitam-se a partir de hoje sugestões de temas para o calendário de natal que vamos fazer aqui no blog durante o mês de dezembro. O tema Quadrados De Chocolate Em Forma De Coisas Vagamente Associadas Ao Natal Em Que O De Dia 24 É Sempre O Pai Natal E Maior Um Bocadinho Que Os Outros não será aceite. RC



Em acabando esta série do Hockney - faltam dois -, seguem-se um por dia os episódios que faltam da primeira série de Look Around You. E com a benção de Robert Popper e Peter Serafinowicz, escrevinhadores de tais e tão bons pedaços de educação -no fundo é de educação que se trata- eis os oito episódios da primeira série de Look Around You.

Episode 1, Maths
Episode 2, Water
Episode 3, Germs
Episode 4, Ghosts
Episode 5, Sulphur
Episode 6, Music
Episode 7, Iron
Episode 8, Brain.



Um, Segue-se um extra do DVD da primeira série de Look Around You,
Dois, É uma musiqueta,
Três, Quem canta é Robert Popper, metade das pessoas que escreveram a série,
Quatro, A outra metade é o outro sujeito de camisolinha mais anafado,
Cinco, O Popper é grande,
Seis, Tenho ali num livro dele um rabisco dele também. RC



Javier Marías, parte dois.

Nome: El Hombre Sentimental
Autor: Javier Marías
Formato: 238 páginas
Dimensões (em centímetros): 1,4 x 17,4 x 10,9
Data de publicação: Março, 2004 (1ª ed., 1986)
Assuntos relacionados: []
Descrição: Una historia de amor en la que el amor no se ve ni se vive, sino que se anuncia y recuerda. (JM)
Tipos de letra: ¿?
Primeira frase do livro: No sé si contaros mis sueños.
Última frase do livro: Pero no debéis preocuparos, yo sería incapaz de seguir su ejemplo.
Dedicatória: A Daniella Pittarello, che magari siga existiendo

Um, Diziam-me quando o começava
- Isso não é de perto nem de longe como o outro
e acrescentavam que
- Isso é uma obra menor
e eu só disse que
- Eu gosto de obras menores
e acrescentei que
- Faz dos escritores pessoas.

Dois, É nada uma obra menor. RC



A Mário Cesariny,

Foi hoje, lembro muito bem porque apanhou toda a gente de espanto, foi hoje a manhã em que comprámos todos o jornal e na primeira página, em letras magistrais e paginação de início de guerra, ou de fim de guerra —de dia de uma coisa só—, vinha a fotografia dele, de um dos dias mais felizes, podia ser ontem, podia ser hoje não fosse o jornal de hoje também, e a legenda, em baixo, dizia em voz alta, berrada, Não morreu Fulano de Tal, a fotografia era a cores, e tinha sol, podia ser ontem, não podia ser hoje afinal porque hoje chove, o dia acordou de costas, e daí o espanto quando comprámos todos o jornal e Não morreu Fulano de Tal, e em letras mais pequenas, ditas ao ouvido, Está vivo, numa frase com nada de jornalístico, deve haver pensámos todos meia dúzia de livros de estilo que dizem que isto não se faz, Vive, continuavam as letras mais pequenas, porque hoje chove ninguém na rua sentíamos viver, e na segunda página, com honras ampliadas de tema de capa, continuava a notícia de que Fulano de Tal, escritor, poeta, contador de histórias, inventor de palavras, quase todas novas, mestre, céptico, director de companhia, produtor, encenador, dramaturgo, pai, cozinheiro, amante de vinhos, europeu, pintor, escultor, arquitecto, desenhador de esquina de rua, domador de leões, filho, utilizador de computadores, tecnófobo, mamífero, masturbador, ateu, agnóstico, crente, realizador, entrevistador, conversador, ciclista, pragmático, artista, célebre, vivo, não morreu ontem de doença nem se sabe aliás que tenha alguma, nem sofreu ou foi vítima de qualquer tipo de acidente durante o dia de ontem, e o texto desembrulhava-se que estava tudo bem com Fulano de Tal, que ao que tinha sido possível apurar Fulano de Tal tinha acordado à hora de todos os dias, e tinha feito o que tinha por hábito fazer todos os dias, escrevera também constava-se e confirmavam-no várias testemunhas oculares uma dezena duns poemas na toalha do restaurante, e esquissara alguém de uma mesa ao lado com uma posição de braços interessante, mas de resto tinha pago com uma nota amassada do bolso das calças —divergia-se aqui se tivera deixado o troco ou o levara consigo—, e saiu, continuadamente só, foi para casa escrever, foi para casa pintar, levantou o filho da escola com um beijo que lhe emprestou, e à hora do fecho desta edição supunha-se, continuava assim a notícia, com palavras tão pouco de notícia, que teria acabado o dia tão igualmente como o começou, ou então —arriscava o jornal— a escrever a próxima carta de amor a alguém que ainda não conhecia, trocámo-nos todos de espanto mais uma vez, a própria notícia escusava-se a pôr-se ponto final, Não morreu Fulano de Tal, diziam os títulos, policopiavam-se nas páginas seguintes rascunhos dos escritos do pintor e reproduções dos quadros do poeta, recolhiam-se depoimentos, primeiro o do Senhor Presidente da República, Em meu nome e em nome do meu povo, e pela sua vida e pela sua obra, congratulo-me que Fulano de Tal não tenha morrido hoje, dizia, e seguiam-se depois as palavras dos amigos, dizia um que É, sem dúvida nenhuma, o nosso definitivo homem de letras, e aliás é engraçado porque combinámos ir almoçar amanhã, dizia outro que O Fulano está numa fase criativa em que se melhora todos os dias, e todos os dias mais, por isso digo-lhe sempre que o prefiro ver amanhã em vez de hoje, e dizia ainda outro, pintor, que Um dos mais importantes quadros que há comprei-lho eu, e vamos pendurá-lo os dois um dia desta semana, e multiplicavam-se a cada página mais amigos, pessoas nas paragens do autocarro procuravam em vão os resumos do futebol, os horóscopos, as notícias dos acidentes e dos assaltos, havia no jornal nada disso, as páginas desdobravam-se de prosa, de desenhos, mas sobretudo de louvores e de homenagens, acabámos de ler o jornal e tinha deixado de chover, o sol acendia molhado os buracos do chão, e dobrámo-nos todos na rua com pessoas com livros nas mãos, com poemas nos cantos da boca, com esculturas de gesso guardadas na pele, e com o jornal enrolado nos bolsos do corpo, numa página perdida para o meio do jornal um dos amigos dizia, só, Lembraram-se de ti, não dizia mais nada, e numa esquina de rua qualquer ao ir para casa tropecei-lhe, estava Fulano de Tal sentado a tomar café com meio açúcar, e todos quantos lhe tropeçavam agradecíamos-lhe, e era só, foi hoje, lembro muito bem, foi hoje que Fulano de Tal evitou morrer, e conseguiu. RC



O homem que morava na casa e que tantas vezes me tentou esmagar à vassourada encolhia-se agora tolhido e positivamente amedrontado no buraco que eu costumava ocupar no fundo da parede, escavado, escuro de susto. Encontrei-o de manhã, disfarçado de sombra, engolida a cabeça pelos braços. Gemia a espaços. Olhei-o de cima para baixo, estranho, uma das patas escusava-se à geometria das patas que funcionam. Lembrei-lhe um pé que uma perna mais curta arrastava. Era o homem que morava na casa. O mesmo que nos olhava de lado pelas solas dos pés e pelas cerdas da vassoura. O mesmo que não suportava ratos, que nos odiava de voz levantada, como a fala grave que as árvores soltam ao crescer.
A mulher, há dois dias deixara de ir aos campos pela manhã. Em tensão, nos fios dos telhados, líamos a terra a ser rasgada quando era de ser rasgada, ou remexida quando era tempo disso, de modo que todos os dias o chão chamava e pedia qualquer coisa, e todos os dias a mulher ia, escusava-se ao sol e saía para fazer as vontades à terra. Há dois dias já queixava-se a terra, primeiro baixinho e agora mais alto, como o ruído eléctrico do verão quando é calor. Voámos os campos à sua procura, mas escondia-se. Há dois dias deixáramos de a ver.
Ao fim de alguns dias, como é normal, deixou de haver migalhas para trazer para a parede. A madeira do chão levantava-se de pó. O homem protegia de patas outro insecto, dez vezes mais pequeno. Colava-o a si como um coração que bate fora do corpo. Percebi aos poucos que era a mulher que também morava na casa, velha, pequena, talvez mãe do homem. Como era ele velho também, cinzento, arrastado, a mãe muito tempo esquecia-se de lhe ser mãe. Maquinalmente fazia o almoço e maquinalmente refazia-o para o jantar. Cruzavam-se pela casa sem se falarem. O homem sabia que a mãe estava lá, e a mãe positivamente sabia que o homem estava lá também, por isso escusavam-se a procurar-se e cada um morava na casa apesar do outro.
As ervas começaram a crescer entre as couves e as batatas, ou em vez das couves e das batatas, e os campos nas traseiras da casa cobriam-se desde há semanas com a aleatoriedade dos verdes que crescem ao acaso. Obedeciam apenas à chuva quando chovia, ou ao sol em dias de sol, e cresciam, multiplicavam-se de folhas e levantavam-se retorcidos do fundo da terra. A mulher continuava sem aparecer, um mês devia ser já, e das catenárias nunca mais vimos a mulher.
A medo começaram os dois insectos a sair da parede, e a arriscar a luz. Digo insectos, e sublinho duas vezes, porque nunca se ausentou do buraco um que não levasse o outro. Conheciam, claro, todos os sítios da casa, mas todos os sítios da casa eram maiores do que os lembravam, e por isso descobriram os espaços debaixo dos móveis, atrás das estantes, dentro das paredes, por baixo das tábuas do chão, e dentro dos interruptores, e dentro das gargantas e dos braços dos canos. Aos poucos descobriram uma outra casa dentro da casa onde moravam, e os espaços dentro dos caixilhos das janelas, e começaram a sair para a parte de trás da casa.
Nunca mais vimos a mulher. Os verdes dos campos já cresceram e já morreram, e chegou já a altura de deverem crescer outra vez. A única coisa constante encosta-se num canto, desmontado, um homem feito de dois paus cruzados e de bocados de lata que a mulher teve nos campos mas que desmontou, e encostou num canto. Comemos agora o que aparece, ou uma restante folha de verde, ou insectos, ou às vezes deixamos mais tempo o telhado e voamos mais longe, mas voltamos, sempre, e nunca mais vimos a mulher.
Os insectos, não os vi mais. Ouço que saíram aos campos e saíram levados no voo de um dos pássaros do telhado. Entretanto, continuamos os ratos escondidos num buraco no fundo da parede, na sombra, positivamente fugidos para sempre do homem que morava na casa, e da mãe dele. RC



Giles' mother I told you, Victor, I can always tell when he's lying.
Victor, Giles' father But that's illogical. For all you know, he may be lying all the time.
Giles' mother He is lying all the time, that's why I can always tell.
Nigel Peacock, the headmaster One of the things this file tells me is that, of the ten staff who teach Giles, seven of them think that his presence is having a seriously damaging effect on other pupils in the group.
Giles' father I see. What about the other three?
The headmaster Well, they think so too. I'm sorry, I was trying to break it to you gently.
in People Like Us (Radio), series one, episode two.



Primeiro ponto, Javier Marías é um sublime escritor de escolher as palavras com as mãos enluvadas, de pensar no fio dos telhados e de olhar ainda para cima, e para dentro, também, sempre.
Segundo ponto, Fujam. Por deus fujam deste livro enquanto é tempo fujam-lhe com todas as forças e mais algumas. Fujam.
Adenda ao primeiro ponto, Marías é sobretudo um personagem que não pertence às nossas ruas, que não escreve no nosso tempo, que segura ainda o mesmo cigarro desde o primeiro livro, com uma cara que já não se usa, como os cachimbos, que se escondem no fundo de uma gaveta.
Adenda ao segundo ponto, Ainda aí estão? Por todos os santinhos fujam, mudem de passeio se virem o livro, fechem os olhos e corram, corram e não olhem nem uma vez para trás, digam adeus a tudo, decorem a cor que têm as coisas e fujam.
Adenda ainda ao primeiro ponto, O livro está tortuosamente, retorcidamente bem escrito, é sempre quase uma irritação que nunca chega, queremos olhar de esguelha para as palavras angulosas e não conseguimos pensar lá outras, a voz de Marías soa a livros velhos perdidos encontrados atrás de uma estante.
Adenda ainda ao segundo ponto, Fujam, o livro tropeça-se dezenas de vezes em gralhas, em letras fora do sítio, outras a mais outras a menos, páginas seguidas de gralhas, erros tipográficos, alfinetes, palavras amputadas, ou remexidas, ou com letras que não lhes são, alfinetes, erros, erros, a voz de veludo falha, engasga-se de tropeções, e dói, dói, alfinetes, dói.
Adenda mais ainda ao primeiro ponto, É, esta edição é triste. Leiam outra.

Nome: Todas as Almas
Autor: Javier Marías
Formato: 190 páginas
Dimensões (em centímetros): 1,1 x 23,3 x 15,4
Data de publicação: Fevereiro, 2002 (1ª ed., 1989)
Assuntos relacionados: Estranheza, Estrangeireza, Adultério.
Descrição: Um professor de espanhol recorda em Madrid os anos que passou em Oxford.
Tipos de letra: ¿?
Primeira frase do livro: Dois dos três morreram depois da minha partida de Oxford, e isso faz-me pensar, supersticiosamente, que talvez tivesse[sic] esperado que eu lá chegasse e consumisse o meu tempo para me darem a possibilidade de os conhecer e deles poder falar agora.
Última frase do livro: O menino Eric vive, e cresce.
Dedicatória: A Eric Southworth, aos meus antecessores Vicente e Félix, e a Elide.

Nota posterior, A primeira frase, no castelhano original, lê-se
Dos de los tres han muerto desde que me fui de Oxford, y eso me hace pensar, supersticiosamente, que quizá esperaron a que yo llegara y consumiera mi tiempo allí para darme ocasión de conocerlos y para que ahora pueda hablar de ellos.
o que me prova que, mesmo sem me começar a chatear com pequenhices, há ali uma forma verbal no singular que devia estar no plural. RC





A série de 16 etchings chama-se A Rake's Progress e foi feita por David Hockney entre 1961 e 1963. RC



(Texto do dia II.)

You who were born with the sun above your shoulders,
You turn me on, you turn me on, you have to know
You who were born where the sun she keeps her distance,
You turn me on, you turn me on, but so does she

You who were born there where beauty is existence,
You turn me on, you turn me, your body heals my soul
You who were born where you shiver and you shudder,
You turn me on, the girl is gone so come on, let's go

(Primeiras estrofes de Greek Song, in Poses by Rufus Wainwright.)



(Texto do dia, 20e1 de novembro de 2000e6.)

Quando o camponês descobriu que a sua mulher o traiu, obrigou-a a preparar a mesa para três. E durante o resto da vida comeram contemplando, diante deles, o terceiro prato vazio.

[in GUERRA, Tonino - Histórias para uma noite de calmaria. Lisboa: Assírio & Alvim, 2002.]





Se deus quiser, ainda hei-de ver morrer muitos papas. RC







(Texto do dia. Desculpem lá não ter as referências bibliográficas. O livro chama-se Do Habitar e o texto é do Raios-Não-É-Que-Ele-Também-Escreve-Bem?-Mestre Álvaro Siza Vieira [pp104-105].)

nenhum aspirador restitui a transparência das águas ou suga as patas dos insectos, finas como cabelo. ¶ O granito das lajes ou das calçadas cobre-se de perigosíssimo limo, o verniz escurece, películas de tinta desprendem-se e põem a descoberto os nós de uma madeira reduzida à capa. Qualquer dedo de anciã pode furar os caixilhos, os vidros estão partidos, caiu o betume, o silicone desprende-se das superfícies, há mofo nos armários e nas gavetas, as baratas resistem aos químicos. Sempre terminou a graxa quando procuramos a lata necessária, os tacos descolam, desprendem-se os azulejos, primeiro um, logo a parede inteira. ¶ Por aí fora. ¶ Viver numa casa, numa casa autêntica, é oficio a tempo inteiro. O dono da casa é simultaneamente bombeiro de serviço (as casas ardem constantemente, ou inundam-se ou o gás escapa-se sem ruído, em geral explode); é um enfermeiro (já viram as lascas de madeira do corrimão cravando-se fundo no sabugo das unhas?); é um nadador-salvador; domina todas as artes e profissões, é especialista em fisica, em química, é jurista ou não sobrevive. É telefonista de serviço e recepcionista, telefona a cada momento, procurando picheleiros, carpinteiros, trolhas, electricistas, e logo lhes abre a porta de entrada, ou a de serviço, acompanhando-os com subserviência; pois deles depende, embora não impeça a necessidade de uma oficina completa, a qual igualmente se vai degradando. E então é necessário afiar lâminas, comprar acessórios, olear, rearrumar; desumidificar; de imediato avaria o desumidificador, e atrás o ar condicionado, as bombas de calor. ¶ Nada contudo ultrapassa a tortura dos livros que se movem misteriosa e autonomamente, desarrumando-se de propósito, atraindo pó com as suas lombadas e a sua espessura magnética. O pó penetra no bordo superior das folhas, pequeníssimos bichos comem-nas com ruído indescritível; as folhas grudam-se, o couro mancha, pingos de água saídos de vasos com flores prestes a morrer escorrem sobre as gravuras, atravessam as telas em furioso processo de dissolução. O capacho da porta de entrada desfaz-se e há um sulco profundo na madeira, os pêlos das piaçabas desprendem-se, partem-se objectos preciosos, as tábuas das mesas e as dos móveis abrem-se em estalidos aterradores, não funciona o autoclismo, o fogão enche-se de fuligem - qualquer dia arde - na cristaleira partem-se os copos da bisavó, rebentam as garrafas de vinho verde a que um quase nada de açúcar dá vida, saltam as rolhas, ou apodrecem, perde qualidade exactamente a colheita mais apreciada. ¶ Quando pela primeira vez não é substituída de imediato uma lâmpada fundida toda a casa perde a luz, o que invariavelmente acontece ao sábado, ao mesmo tempo que rebenta um pneu do carro disponível. ¶ Por isso considero heróico possuir, manter e renovar uma casa. Em minha opinião deveria existir a Ordem dos Curadores de Casas e todos os anos atribuía a respectiva comenda e um elevado prémio pecuniário. ¶ Mas quando esse esforço de manutenção não é aparente, quando o saudável cheiro a cera de uma casa, por outro lado bem ventilada, se mistura com o perfume das flores do jardim, e quando nelas nós - visitantes irresponsávelmente pouco atentos aos instantes de felicidade - nos sentimos felizes, esquecendo as nossas angústias de nómadas bárbaros, então a única medalha possível é a da gratidão, do silencioso aplauso; um momento de paragem, olhando em volta, mergulhando na atmosfera doirada de um interior de Outono, ao fim do dia.





Na categoria Filmes-Que-Quero-Ir-Ver-E-Que-Iupi-Estreiam-Mas-Depois-Vai-se-A-Ver-E-Não,-Só-Em-Lisboa. RC



Roy Mallard Are your parents important to you?
Maureen Barton Hmmm... Do you know, I can't remember.
Roy Mallard Well, you don't feel that perhaps you owe them something after they've worked so hard to send you away to school?
Maureen Barton That's right, I don't. I remember now.
Roy Mallard Do you look down on your father for what he's done?
Maureen Barton Why, what has he done now?
Roy Mallard No, I mean--, farming.
Maureen Barton Oh, I see. No, no, of course not, it's just that he was put on this earth to do one thing and, that's to farm.
Roy Mallard And what about your mother?
Maureen Barton Oh. OK, two things.
in People Like Us (Radio), series one, episode one.





O mundo é um lugar imbecil. Neil hannon é do tamanho que é
(grande grande),
mas o último CD vendeu muito pouco. O primeiro single vendeu pior e o segundo single pior ainda. Ele lá fez um choradinho
(- Come on come on come on oh come on just one more come on)
e lá lhe deixaram lançar um terceiro single, mas só em formato digital e numa edição limitada em vinil à venda só no site. No lado A, A Lady of a Certain Age, é unanimemente considerada uma das melhores do neil. No lado B, uma cover de Lili Marlene que não existe em mais formato nenhum.
O primeiro single comprei-o no mundo. O segundo não havia desta vez que lá fui. O terceiro chegou ontem.
Chegou ontem o meu 7''. Lembro-me agora que não tenho onde o ouvir. RC



Nada melhor para uma semana de outono, com as folhas a desistirem das árvores e com o sol a fechar-se a um canto aos bocadinhos, do que um livro sobre cansarmo-nos de as casas terem lado de fora. RC

Nome: Notes from Underground
Autor: Fyodor Dostoyevsky
Formato: 152 páginas
Dimensões (em centímetros): 1,3 x 18 x 11,1
Data de publicação: 2006 (1ª ed., 1864)
Assuntos relacionados: Moral, Desilusão, Sociedade, Declínio, Eu.
Descrição: Qual é melhor, uma felicidade vulgar ou um sofrimento refinado?
Tipos de letra: MT Dante
Primeira frase do livro: I am a sick man ... I am an angry man.
Última frase do livro homem: I shall write no more from the underground ...
Dedicatória: (nota introdutória de Dostoyevsky)

After all, to tell a long story about how I missed life through decaying morally in a corner, not having sufficient means, losing the habit of living, and carefully cultivating my anger underground - really is not interesting;
...





Já há muito que não ia ver um filme duas vezes ao cinema. RC



Man talking about St Jerome's First Lady People have thought that the large number of clothes she used to travel with was simply an example of vulgar ostentation, but if they'd seen the way she used to eat they'd have realised she needed that many changes of clothing.
in Delve Special, series four, episode four.





Mobiliário em inox e decoração, coisas giras, ou então não tão giras como isso, mas tem coisas giras, não são todas giras mas algumas são giras, quer dizer, depende do conceito de giro de cada um.

[Acho que se um dia tiver de atender um cliente ponho-o lá fora só para não ter de lhe vender alguma coisa.] DS



Isto é tão supremamente bom, está tão bem feito, e dá-me sempre uma espécie de calorzinho de cada vez que vejo,
e já que anda a repetir na BBC2, tomem lá,
LOOK AROUND YOU, número um,
(há um número zero e depois há mais sete). RC





[Ah gostaram foi?]

Russell Nicholson I explained it all before: during the day I worked for the british, at night I worked for the russians, at the weekend I did the gardens.
David Lander Did this life of duplicity not worry you?
Russell Nicholson Of course it did, I suffered terribly from lack of sleep, I had to be up all hours.
David Lander No, what about your conscience?
Russell Nicholson Oh that. My conscience was perfectly clear. You see, I was acting in the interests of peace.
David Lander Because the russians paid you in money and sex.
Russell Nicholson Peace was my real payment.
David Lander You now live a life of luxury in this villa overlooking the Black Sea.
Russell Nicholson Yes. Have you noticed how much peace I've got here?
in Delve Special, series two, episode four.





Russell Nicholson I joined the MI5 in 1953, and the KGB in 1959. After that I worked for both of them. From my point of view it was a very good career move. It efectively doubled my chances of promotion.
in Delve Special, series two, episode four.







'"Ha, ha, ha! You will be finding enjoyment in toothache next," you cry, with a laugh.
"Well, even in toothache there is enjoyment," I answer. I had toothache for a whole month and I know there is. In that case, of course, people are not spiteful in silence, but moan; but they are not candid moans, they are malignant moans, and the malignancy is the whole point. The enjoyment of the sufferer finds expression in those moans; if he did not feel enjoyment in them he would not moan. It is a good example, gentlemen, and I will develop it. Those moans express in thefirst place all the aimlessness of your pain, which is so humiliating to your consciousness; the whole legal system of nature on which you spit disdainfully, of course, but from which you suffer all the same while she does not. They express the consciousness that you have no enemy to punish, but that you have pain; the consciousness that in spite of all possible Wagenheims you are in complete slavery to your teeth; that if someone wishes it, your teeth will leave off aching, and if he does not, they will go on aching another three months; and that finally if you are still contumacious and still protest, all that is left you for your own gratification is to thrash yourself or beat your wall with your fist as hard as you can, and absolutely nothing more. Well, these mortal insults, these jeers on the part of someone unknown, end at last in an enjoyment which sometimes reaches the highest degree of voluptuousness. I ask you, gentlemen, listen sometimes to the moans of an educated man of the nineteenth century suffering from toothache, on the second or third day of the attack, when he is beginning to moan, not as he moaned on the first day, that is, not simply because he has toothache, not just as any coarse peasant, but as a man affected by progress and European civilisation, a man who is "divorced from the soil and the national elements," as they express it now-a-days. His moans become nasty, disgustingly malignant, and go on for whole days and nights. And of course he knows himself that he is doing himself no sort of good with his moans; he knows better than anyone that he is only lacerating and harassing himself and others for nothing; he knows that even the audience before whom he is making his efforts, and his whole family, listen to him with loathing, do not put a ha'porth of faith in him, and inwardly understand that he might moan differently, more simply, without trills and flourishes, and that he is only amusing himself like that from ill-humour, from malignancy. Well, in all these recognitions and disgraces it is that there lies a voluptuous pleasure. As though he would say: "I am worrying you, I am lacerating your hearts, I am keeping everyone in the house awake. Well, stay awake then, you, too, feel every minute that I have toothache. I am not a hero to you now, as I tried to seem before, but simply a nasty person, an impostor. Well, so be it, then! I am very glad that you see through me. It is nasty for you to hear my despicable moans: well, let it be nasty; here I will let you have a nastier flourish in a minute. ..." You do not understand even now, gentlemen? No, it seems our development and our consciousness must go further to understand all the intricacies of this pleasure. You laugh? Delighted. My jests, gentlemen, are of course in bad taste, jerky, involved, lacking self-confidence. But of course that is because I do not respect myself. Can a man of perception respect himself at all?


[In DOSTOYEVSKY, Fyodor – Notes from the Underground. Edição desconhecida.
Eu estou a ler outra tradução: DOSTOYEVSKY, Fyodor - Notes from Underground. London: Penguin, 2006.]



O filme chama-se Dans Paris. Escrito e realizado por Christophe Honoré e com Louis Garrel.
Louis Garrel é daquele tipo de gente que é luz. A banda sonora é sublime. Paris é linda no natal. Quero ir ver outra vez. RC





A cidade de Sofrónia compõe-se de duas meias cidades. Numa fica a grande montanha russa de íngremes bossas, o carrocel com a sua auréola de correntes, a roda das gaiolas giratórias, o poço da morte com os motociclistas de cabeça para baixo, a cúpula do circo com o cacho dos trapézios a pender no meio. A outra meia cidade é de pedra e mármore e cimento, com o banco, os opiários, os prédios, o matadouro, a escola e tudo o resto. Uma das meias cidades está fixa, a outra é provisória e quando acaba o tempo da sua estadia despregam-na, desmontam-na e levam-na dali para fora, para a enxertar nos terrenos vagos de outra meia cidade.
Assim todos os anos chega o dia em que os operários destacam os frontões de mármore, deitam abaixo as paredes de pedra, os pilares de cimento, desmontam o ministério, o monumento, as docas, a refinaria de petróleo, o hospital, e carregam-nos em reboques de grandes camiões para seguirem de praça em praça o itinerário de todos os anos. Aqui fica a meia Sofrónia das barracas de tiro ao alvo e dos carrocéis, com o grito suspenso da naveta da montanha russa do avesso, e começa a contar quantos meses, quantos dias deverá aguardar antes que retorne a caravana e recomece a vida inteira.

[In CALVINO, Italo – As Cidades Invisíveis. Lisboa: Teorema, 2003. p65]







Ia eu ver por quanto afinal se tinha vendido o Retrato de Angel Fernández de Soto, Picasso, 1903, mas afinal não, afinal há chatice e a Christie's decidiu não pôr a leilão o quadro porque judeus, nazis, esse tipo de coisas.
Entretanto, a Sotheby's leiloou ontem um Cézanne e um Modigliani, sendo que o Cézanne tinha sido comprado há seis anos
(note-se seis)
por catorze milhões de euros
(note-se 14)
e foi vendido agora
(ah e note-se milhões como em 1,000,000)
por vinte e nove milhões de euros
(gulp note-se 29)
ou seja, por que raio não estamos nós a investir em arte? RC



Já há muito tempo que não trago livros para aqui, não há tempo a verdade é que não há tempo para ler, sequer para ler, mas à custa de um trabalho regressei a um livro e relembrei-o tão bom que me pareceu bem dizer-vos para lerem. RC

Nome: As Cidades Invisíveis
Autor: Italo Calvino
Formato: 166 páginas
Dimensões (em centímetros): 1,7 x 20,7 x 14,5
Data de publicação: Dezembro, 2003 (1ª ed., 1990)
Assuntos relacionados: Cidades, Pessoas
Descrição: Cidades e pessoas.
Tipos de letra: ?
Primeira frase do livro: Nada garante de Kublai Kan acredite em tudo o que diz Marco Polo ao descrever-lhe as cidades que visitou nas suas missões (...)
Última frase do livro: (...) tentar e saber reconhecer, no meio do inferno, quem e o que não é inferno, e fazê-lo viver, e dar-lhe lugar.
Dedicatória: Não

[Uma das cidades (p129):]

As cidades e os mortos. 4.

O que torna Árgia diferente das outras cidades é que em vez de ar tem terra. As ruas estão completamente cobertas de terra, as salas cheias de argila até ao tecto, sobre as escadas assenta outra escada em negativo, por cima dos telhados das casas pairam camadas de terreno rochoso como céus com nuvens. Se os habitantes poderão andar pela cidade alargando os cunículos dos vermes e as fendas em que se insinuam as raízes, não o sabemos: a humidade quebra e deixa-lhes poucas forças; convém que fiquem quietos e deitados, de tão escura que é.
De Árgia, cá de cima, não se vê nada; há quem diga: «É lá em baixo» e só nos resta acreditar; os lugares são desertos. De noite, encostando o ouvido ao chão, às vezes ouve-se bater uma porta.


Nota: Relembrei-o melhor do que. Há idades para cada livro. Estou mais perto.





David Lander Now, in your original statement to the police you described the robbers as two men in their mid-30s, both weighing approximately 15 stone and both well over 6 foot.
George Wilson Hmm-hmm.
David Lander Yet the following month you picked out 19-year-old, 8 stone, 5-foot-6-inch Kevin Watts as the only man who'd commited the robbery.
George Wilson Hmm-hmm.
David Lander Well, there would appear to be at least eleven years, seven stone, six inches and one man difference between your original description and the man you later identified as the robbers.
George Wilson He was wearing a mask, you know.
in Delve Special, series two, episode one.







É todos os anos por esta altura que, juntamente com as castanhas e com o chegar a casa sempre já de noite, começa a apetecer a bela musiquinha de natal. Este ano é este rapaz que fornece. Sai para o fim do mês uma caixa de cinco CDs que Sufjan Stevens gravou todos os anos desde 2001. Chama-se Songs for Christmas, e para já pode ouvir-se tudo tudo tudo aqui, clicando na capa de cada CD. Bom natal. RC





Por não saberes fazer coisas mal. Parabéns, rapaz, sempre. RC




David Hockney, Small Head of Gregory, 1976.



Vai uma pessoa ao mundo ver coisas assim e depois dizem-nos com alguma premência que é mesmo preciso voltar para cá. RC


Marc Chagall, Le Poète Allongé, 1915.




David Hockney, Peter Getting Out of Nick's Pool, 1966.





Neil Hannon + Robert Webb + David Mitchell
+ Velàsquez + David Hockney + Klee um ou dois Klee + Rodin
+ doubledeckers + batatinha frita em St. James Park + Virgin Megastore em Oxford Street + rampa da Tate Modern + (...)
Vou lá viver um bocadinho e já volto. RC


Hoje


01|dezembro|2006

The many faces of robert webb.
Isso do ricardinho acabou.

(Rufus Wainwright | Rules and Regulations
> from Release the Stars)



A ler Frost de Thomas Bernhard e ouvir e a ver coisas que se fôssemos aqui a pô-las todas havíamos de chegar atrasados a sítios onde temos horas para chegar.

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